O parlamento da Ucrânia nomeou Oleksander Turchynov como presidente
interino. Ele assume o comando do país após o presidente Viktor
Yanukovych ter sido derrubado no sábado, em votação no paralamento que
se seguiu a uma sangrenta semana de protestos nas ruas.
Turchynov disse aos deputados que eles têm até terça-feira para formar um novo governo de coalização.
O presidente interino é aliado da
ex-primeira-ministra Yulia Tymoshenko, importante opositora do governo
deposto que foi libertada ontem. Ela estava presa desde 2011, quando foi
condenada - numa decisão controversa - a sete anos de prisão, por abuso
de poder.
Turchynov já havia sido nomaedo presidente do
legislativo ontem, depois que o chefe anterior renunciou. O paradeiro de
Yanukovych, que descreveu ontem a decisão do parlamento como um golpe,
permanece obscuro.
Ele teria viajado para Kharkiv, no leste do
país, na noite de sexta-feira. Segundo a imprensa local, autoridades
ucranianas dizeram que ele foi parado pela polícia de fronteira ao
tentar voar para a Rússia a bordo de um avião particular.
No sábado, o parlamento também decidiu retirar o status oficial da língua russa, cancelando uma lei do governo Yanukovych.

Turchynov é o novo presidente interino da Ucrânia
Após uma semana sangrenta, milhares de
manifestantes permanecem neste domingo no centro de Kiev, mas a
atmosfera na Praça da Independência parece calma.
As eleições para a Presidência estão marcadas
para 25 de Maio. Em declarações à BBC, um dos líderes da oposição,
Vitaly Klitschko sugeriu que será candidato.
"Eu quero fazer da Ucrânia um país europeu
moderno", disse ele. "Se eu puder fazer isso como presidente, eu vou
fazer o meu melhor".
Os desdobramentos deste fim de semana se seguem a
três meses de protestos antigoverno. Na última semana, a violência se
agravou - até o momento, o governo calcula 88 mortos na onda de
confrontos.
A crise coloca em xeque o futuro dos 45 milhões
de habitantes da Ucrânia, que ficam no meio de uma disputa de poder
estratégica entre Rússia e o Ocidente.
A BBC Brasil fez um guia para explicar o que está em jogo:
O que motiva os protestos?
Os protestos começaram quando Yanukovych
rejeitou, em novembro, um acordo com a União Europeia, preferindo uma
aproximação comercial com a Rússia.
Milhares de pessoas - favoráveis à integração
com a Europa - deram início a manifestações pacíficas e à ocupação da
Praça da Independência.
Desde então, houve repressão policial aos
protestos, a aprovação de leis restringindo as manifestações e a prisão
de ativistas - fazendo com que as demonstrações antigoverno se
intensificassem.
Muitas pessoas começaram a protestar menos por
causa da integração à Europa e mais por temer que Yanukovych estivesse
tentando servir aos seus próprios interesses e aos de Moscou.

Manifestantes continuam na Praça da Liberdade, mas clima parece calmo
O que causou a violência de fevereiro?
O derramamento de sangue de 20 de fevereiro foi o
mais grave até o momento. Acredita-se que 77 pessoas tenham sido mortas
e 600 feridas em 48 horas.
Vídeos mostram franco-atiradores disparando
contra manifestantes. Os dois lados se culpam mutuamente, mas ainda não
está claro quem atirou a primeira pedra ou disparou o primeiro tiro.
Governo e oposição fizeram, então, um acordo,
que previa anistia a manifestantes presos e a desocupação, por parte dos
opositores, de prédios estatais.
A oposição também pedia que o Parlamento
discutisse mudanças na Constituição para reduzir os poderes
presidenciais. Como isso não foi aceito, opositores promoveram
manifestações diante do Legislativo.
Quem são os manifestantes?
Os protestos são mais fortes na região de Kiev e
no oeste ucraniano (onde é maior a afinidade com a Europa e o Ocidente)
do que no leste e no sul, onde fala-se russo graças à imigração durante
o período soviético.
Os líderes de três partidos da oposição - Vitali
Klitschko, do movimento Udar, pró-UE; Arseniy Yatsenyuk, do Fatherland,
maior grupo opositor; e Oleh Tyahnybo, da extrema direita Svoboda-
estão na Praça da Independência, tentando direcionar os protestos e
angariar apoio.

Yulia Tymoschenko foi libertada e discursou para multidão em Kiev
Mas parte da população mantém sua desconfiança
quanto a eles. O partido Fatherland, em especial, é criticado por seus
anos recentes no governo e considerado como parte do establishment
político.
Alguns grupos de extrema direita estão na
dianteira dos confrontos com a polícia, mas não está claro se eles têm
apoio de grande parte dos ucranianos.
O que está em jogo?
A crise na Ucrânia faz parte de um cenário
maior. O presidente russo, Vladimir Putin, quer fazer de seu país uma
potência global, que rivalize com EUA, China e UE. Para isso, ele está
criando uniões aduaneiras com outros países e vê a Ucrânia como parte
crucial disso - inclusive pelos profundos laços históricos e culturais
entre ambos.
Já a UE defende que a aproximação com a Europa e
eventual entrada no bloco europeu trariam bilhões de euros à Ucrânia,
modernizando sua economia e dando-lhe acesso ao mercado comum europeu.
No leste, muitos ucranianos que trabalham em
indústrias (fornecedoras da Rússia) temem perder seus empregos se Kiev
se aproximar da Europa. Mas, no oeste, muitos anseiam pela prosperidade e
pelo estado de direito que, acreditam, podem ser alcançados com acordos
com a UE.
O país será dividido em dois?
Muito se fala das divisões linguísticas e culturais entre leste e oeste da Ucrânia.
Mapas mostram que áreas onde grande parte da
população fala russo votaram em massa por Yanukovych em 2010. Para
alguns analistas, isso indica que o país pode rachar ao meio, de forma
violenta, caso não se negocie uma saída para a crise.
Outros alegam que essa divisão é improvável - e que, mesmo no leste pró-Rússia, muitos se identificam como ucranianos.
O que aconteceu com Yanukovych?
O presidente havia assinado um acordo com
líderes da oposição, após conversas com chanceleres de três países
europeus (França, Alemanha e Polônia).

Viktor Yanukovych diz ser vítima de um golpe de Estado
Ele ofereceu eleições antecipadas (em dezembro) e
a formação de uma nova coalizão de governo, dizendo-se preparado para
reformar a Constituição e devolver mais poderes ao Parlamento.
Mas na noite deste sábado, a guarda armada ao
redor dos escritórios governamentais sumiu; o destino de Yanukovych
também se tornou incerto.
Aparentemente, ele deixou a capital, mas deu uma entrevista de TV insistindo que ainda está no poder.
Só que sua arquirrival Yulia Tymoshenko foi
libertada e levada a Kiev, cidade que Yanukovych parece não mais
controlar. Muitos de seu partido também parecem desertá-lo.
Qual o papel da Rússia?
A Rússia claramente tem uma forte influência
sobre Yanukovych, o qual foi apoiado por Moscou durante a Revolução
Laranja de 2004 - quando sua eleição foi considerada fraudulenta.
A Rússia suspendeu empréstimos quando o governo
ucraniano renunciou e restringiu o comércio bilateral quando a Ucrânia
flertou com o Ocidente. A UE chamou isso de pressão econômica
"inaceitável".
Moscou acusa a UE de tentar fazer o mesmo ao oferecer acordos de livre comércio a Kiev.
Nos bastidores, acredita-se que esteja operando
também a grande força de ricos oligarcas ucranianos. O mais rico deles,
Rinat Akhmetov, emitiu comunicado apoiando protestos pacíficos. Outros
oligarcas parecem apoiar Yanukovych.
Fonte: BBC Brasil 23.02.2014
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